Dávio Figueiredo, 15 dias em Lobitos, Peru

Dávio Figueiredo, o filho de 16 anos do lendário Dadá Figueiredo, esteve em sua primeira surf trip só entre amigos, pro norte do Peru, mais precisamente em Lobitos.

Dávio competiu na etapa WQS de lá e ficou surfando por 15 dias com seu amigo Facundo Arreyes, o Cuti. O vídeo da trip foi editado por Conrado Lage ao som de The Adolescents e Black Flag (Dávio hoje é guitarrista de uma banda de punk chamada Filhos de Porteiro, soa familiar?), e quando pedimos para que ele contasse da sua trip, recebemos um texto que tivemos que publicar praticamente sem edição nenhuma:


“Chegando no aeroporto do Peru com o Cuti, o motorista da pousada já tava me esperando lá. Era um tal de ‘Pantito’, um velhinho maluco que no meio do caminho quase capotou o carro umas três vezes numa estradinha de terra. Detalhe que eu tinha que ficar falando com ele pra ele não dormir no volante, e como meu portunhol é ótimo, ele só mexia a cabeça.

Chegando na pousada eu disse pro dono, Nico, que estava enjoado e perguntei se ele não podia me arranjar um humilde copo d’água. Então ele me mostrou a geladeira da pousada e disse ‘pegues o que quiser’. Eu, bobo, pensei: ‘nossa que cara legal, eu posso pegar o que eu quiser na geladeirinha!’, e como o Cuti me zoou por causa disso… logo depois eu me toquei que ele anotava tudo no maldito caderninho dele. Então tomei uma água e fui dormir já ansioso pra surfar Lobitos. Acordei cedo e fui ver o mar. Estava quase flat e com um crowd fudido, mas mesmo assim saí correndo pra água pra pegar umas ondas e botar minhas pranchas novas no pé.

O primeiro dia de ondas estava fraco, então só no terceiro dia da viagem entrou um swell e mesmo com um crowd maldito eu consegui pegar umas ondas. Mas até então ainda não tinha pegado Lobitos de verdade, com o crowd atrapalhando muito pois também tinham muitos competidores na água e um local, o ‘cara de pedra’, que surfava muito mal mas vinha em todas as melhores ondas.

Dois dias antes da competição, uma ‘avélha’ (como dizia Felipe Soarez, um argentino que tentava falar português mas não conseguia) me picou – uma ‘avélha’ é uma abelha, no caso – e por incrível que pareça, o meu braço ficou gigante! Parecia que eu tava com elefantíase, então cheguei pro Nico e disse que queria ir em um hospital. Ele disse “No és nada, maricon!”. Enfim, tive que insistir pra ele me levar no hospital e chegando lá, tomei uma injeção na veia, uns comprimidos e depois melhorei.

No primeiro dia de competição, minha expectativa era ótima. Eu estava com pranchas novas, surfando bem e viajando sozinho com meus amigos num lugar de altas ondas. Passei minha primeira bateria, que era contra dois peruanos e um brasileiro, e fiquei feliz por ter me classificado. Já na segunda fase, odeio ter que comentar isso, mas todos disseram que eu fui garfado contra um peruano e eu também achei que deram pouco na minha última onda, que era a da virada. Meu amigo de São Paulo, Kadu Medeiros, também foi garfado muito feio. Na hora que você perde uma competição, é a pior sensação do mundo, mas logo depois, olhei em minha volta e vi o lugar que eu estava e pensei ‘foda-se, vou surfar até apodrecer’. Eu estava vendo a bateria do Cuti do segundo round, ele surfou muito bem, mas não se classificou. Quando estamos voltando pra pousada, uma 4×4 Hilux nos oferece carona pra Piscinas… claro que aceitamos o convite e pegamos altas ondas lá. Até aquele momento tinha sido a melhor session da viagem.

Após o quinto dia da trip, nos mudamos de pousada pra uma melhor e mais barata… O Nico era muito pão duro (risos)! Chegando lá na nova pousada, conhecemos uma galera de Maresias muito gente fina e pegamos mais alguns dias de marolas, com o swell sumindo. Todos estavam esperando o swell do dia 28. Provavelmente menos crowd, muito mais perfeito e muito maior.

Chegando no dia, eu e Cuti acordamos de madrugada e fomos pra praia. Quando eu achava que ia ser o primeiro a entrar, já vejo alguem rabiscando a vala, mas não desanimei e fui pra dentro d’gua numa fissura animal. O momento mais marcante da trip foi minha primeira onda desse dia. O sol refletia nela, misturando um laranja com o azul da água em uma parede muito em pé de uma esquerda perfeita. Ali naquele momento eu já pensava: ‘Foda! Essa onda já valeu a trip!’, esse dia fiquei das 5:50 até as 11:30 surfando, e dia 29 não foi diferente! A única diferença foram os tubos que rolaram no dia 29, que eu estava esperando a trip inteira.

No dia 30, já morto da trip, eu e Cuti fomos na pousada que nós havíamos ficado no início da viagem e logo veio o Nico falar conosco: ‘No hai internet en la posada que estan?’, puto da vida porque saímos de lá, perguntando pro Cuti que estava usando o iPod. Alguns minutos depois, Nico senta em sua cadeira, pega seu maldito caderninho e fica um tempão em silêncio. O Cuti não aguentou do meu lado e começamos a rir, aí vem o Nico gritando: ‘Daviiiiiiiiii!’ (o peruano inútil não sabe nem pronunciar o meu nome), ‘estás me devendo 11 soles!’, e aí rimos demais… só pude dizer: ‘mañana te pago, si?’, e agora gritar ‘Daviiii’ um pro outro virou uma piada interna nossa.”


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